O caso do médico de Serra Negra (SP) que postou uma foto em uma rede social debochando da maneira de falar de um paciente é apenas um exemplo de como o surgimento de novas formas de interação social vai exigir atualizações cada vez mais constantes no Código de Ética Médica.
O que, para o profissional em questão, era uma brincadeira entre médicos e aparentemente sem maiores consequências, acabou ganhando repercussão nacional. O profissional chegou a pedir desculpas ao paciente e sua família, mas a postagem resultou no afastamento dele da unidade de saúde em que atuava.
Desde 2011, o Conselho Federal de Medicina já se preocupa com a exposição em redes sociais, tanto que criou uma resolução para regular o assunto, atualizada posteriormente em 2015. Agora, com a atualização do texto que orienta a conduta médica no país, o tema ‘redes sociais’ deve ganhar ainda mais espaço no texto. Segundo o Dr. José Fernando Maia Vinagre, coordenador adjunto da Comissão Nacional de Revisão do Código de Ética Médica, as informações contidas na Resolução 1.974/2011 e na atualização de 2015 (Resolução 2.126/2015) passarão a ser contempladas também no Código de Ética Médica.
As resoluções estabelecem “os critérios norteadores da propaganda em Medicina, conceituando os anúncios, a divulgação de assuntos médicos, o sensacionalismo, a autopromoção e as proibições referentes à matéria” e consideram mídias sociais: sites, blogs, Facebook, Twiter, Instagram, YouTube, WhatsApp e similares.
O documento esclarece que as mídias sociais dos médicos e dos estabelecimentos assistenciais em medicina “devem obedecer à lei, às resoluções normativas e ao Manual da Comissão de Divulgação de Assuntos Médicos (Codame)”.
A normatização se destina, no entanto, mais à regulamentação da publicidade médica, vedando aos médicos, por exemplo, “a publicação nas mídias sociais de autorretrato (selfie), imagens e/ou áudios que caracterizem sensacionalismo, autopromoção ou concorrência desleal”, bem como se preocupa com a exposição do paciente, sendo vedado ao médico, por exemplo, expô-lo “como forma de divulgar técnica, método ou resultado de tratamento, ainda que com autorização expressa do mesmo”.
No entanto, para o médico Dr. Sergio Rego, pesquisador titular da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca da Fundação Oswaldo Cruz (ENSP/FIOCRUZ), a resolução não contempla a situação envolvendo o médico de Serra Negra. Para ele, o Facebook é uma mídia nova, utilizada muitas vezes para escrever coisas sem importância por usuários que crêem que estão confidenciando tais informações em sigilo a amigos, quando, na realidade, não estão. Essas postagens, segundo o pesquisador, “equivalem a uma declaração pública e as consequências, em geral, não são previsíveis”.
“O grande erro desse médico foi ter debochado na presença do paciente e exposto isso publicamente. Ele é jovem, fez uma grande besteira e está sofrendo as consequências.”
Segundo o pesquisador, há publicações que contemplam o assunto, como, por exemplo, o livro Trambiclínicas, Pilantrópicos, Embromeds: um ensaio sobre a gíria médica, de Christopher Peterson, publicado pela Editora Fiocruz. O Dr. Rego conta que a obra é resultado de uma tese de doutorado defendida na instituição e traz a discussão acadêmica de gírias médicas e casos, “que expressam problemas muito sérios e que não são enfrentados pela corporação”.
De toda a forma, o Dr. Rego destaca que o Código de Ética Médica precisa cuidar também dessa questão, deixando “cada vez mais claro que o respeito ao paciente é fundamental, seja no atendimento, seja nos passatempos virtuais. A liberdade de expressão é fundamental, mas o respeito ao outro também”.
Fonte: Medscape